São Miguel

Em 1560, a Vila de Santo André da Borda do Campo foi atacada pela Confederação dos Tamoios e foi praticamente dizimada, os sobreviventes foram transferidos para a Vila de São Paulo de Piratininga onde se abrigaram no Colégio dos Jesuítas.
Piquerobi, irmão do Grande Cacique Tibiriçá, incomodado com as influências culturais causadas pelo convívio com os brancos e indígenas de outras etnias se mudou, juntamente com um grande grupo de índios Guaianá, para as terras de Ururaí – hoje São Miguel Paulista – e ali se estabeleceu. No mesmo ano, chega o Pe. José de Anchieta para visitar os índios que já conhecia, a relação entre os indígenas e Anchieta era extremamente pacífica e cordial, de modo que, Piquerobi não se opunha aos trabalhos dos jesuítas com os nativos.
Representação de Capela em Pau-a-pique e Sapê, similar a construída por Anchieta em 1622

Percebendo o grande potencial estratégico do local, Anchieta ergue naquele local uma pequena Capela de pau-a-pique em louvor a São Miguel Arcanjo, batizando o aldeamento criado com o nome de São Miguel de Ururaí – que quer dizer Rio dos Pássaros. A opção deste Arcanjo para padroeiro da aldeia pode ser atribuída ao fato de os nativos chefiados por Piquerobi se identificarem com a figura de São Miguel por seu espírito guerreiro. O Arcanjo também representa a vitória do bem sobre o mal, e este era o caso da missão dos jesuítas com respeito aos indígenas dissidentes do Pátio do Colégio.



A localização do novo aldeamento favorecia tanto a congregação dos índios, quanto o bloqueio dos ataques da Confederação dos Tamoios ao colégio de Piratininga. Os ataques eram, em sua maioria bloqueados nesta região. Os índios Guaianazes eram uma tribo tradicionalmente guerreira - inimiga por tradição dos Tupinambás - mas pacífica, nunca combatiam fora de suas terras, mas sempre se defendiam de todos os ataques e invasões

Em 1584, quando escreve Informações do Brasil e suas Capitanias, Anchieta é preciso. Referindo-se a São Paulo, comenta que ao redor da vila havia doze aldeias não muito grandes, distantes de uma a três léguas, as quais eram atingidas continuamente por caminhos terrestres e fluviais. Além do batismo recebiam outros sacramentos, e com o passar do tempo essas aldeias praticamente se juntaram em duas. Uma delas ficava a uma légua da vila e a outra distante duas léguas, sendo que ambas possuíam igreja. Anchieta ainda esclarece que tais aldeias eram São Miguel e Nossa Senhora da Conceição dos Pinheiros, com um total de mil pessoas. Ainda comentou haver não muito longe, grande número de índios a serem convertidos. Nota-se, portanto, que São Miguel e Pinheiros são os bairros mais antigos da cidade de São Paulo e, indiscutivelmente, desempenharam relevante papel para a formação e desenvolvimento da vila de São Paulo, fundada apenas seis anos antes.

Em 1586, ao escrever o Catálogo dos padres e irmãos da província do Brasil, documento que encontramos no Arquivo Romano da Companhia de Jesus, no Vaticano, com a referência bras 51 28, ao citar os padres que atuavam na Capitania de São Vicente, quando se refere ao Planalto apenas menciona os que atuavam no Colégio ou Casa de Piratininga e na “Residencia de S. Miguel annexa a la casa”. Em São Miguel, o padre Diogo Nunez era o confessor e professor da língua. Isso significa que se os jesuítas fundaram outras aldeias no planalto de Piratininga, apenas no atual Pátio do Colégio e em São Miguel fixaram residência. Nesses locais houve um intenso trabalho com a presença em tempo integral de jesuítas, sendo que as demais aldeias eram apenas visitadas.

Os trabalhos apostólicos em São Miguel e a existência da igreja anteriormente referida por Anchieta, são confirmados por Jerônimo Leitão, capitão de São Vicente, na Carta de Doação de Terras, de 12 de outubro de 1580, conferida aos índios de Ururaí por serem cristãos e pelo apoio em defesa da vila. Chefiados por esse capitão, em 1565, os índios de São Miguel participaram da luta contra os Tamoios em Cabo Frio, e ainda apoiaram a expedição de Estácio de Sá que Anchieta ajudou a organizar, resultando na expulsão dos franceses da Guanabara e na fundação do Rio de Janeiro.

Devido a sua grande importância o Aldeamento de São Miguel de Ururaí, foi elevado a Padroado Real, era administrado diretamente pelo Rei de Portugal, o que diminuía a influência dos Jesuítas sobre o destino dos índios. Por ser elevada a um estado de tamanha importância, a pequena Capela construída pelo Pe. José de Anchieta foi demolida e construída uma nova em Taipa de Pilão, pelo Pe. João Álvares e pelo Bandeirante Fernão Munhoz. Naquele período o tamanho da Capela ou Igreja era diretamente ligado a sua importância, ou seja, jamais se construiria uma capela como a que se encontra em São Miguel, se o local não fosse de extrema importância.

 Muitos índios, sobretudo os jovens e guerreiros, foram retirados de São Miguel, tanto para ajudar as bandeiras quanto nas batalhas dos portugueses contra os franceses, no Rio de Janeiro. Essa retirada maciça, somada a expulsão dos Jesuítas pelo Marquês de Pombal em 1759, expõe o aldeamento de São Miguel de Ururaí as invasões dos colonos que, aos poucos foram tomando as terras dos indígenas e escravizando os poucos índios que ali restavam. Seguiu-se um período de abando  do aldeamento e da Capela que foi posteriormente entregue aos cuidados dos Franciscanos, que promoveram a grande reforma liderada pelo Frei Mariano da Conceição Veloso.